terça-feira, 3 de junho de 2008

O Manifesto Latente da Clínica Psicanalítica

Oscar Cesarotto & Márcio Peter de Souza Leite


O mundo atual não favorece uma existência aprazível para ninguém e, quando se somam os conflitos pessoais, com freqüência a vida cotidiana se transforma num inferno individual. Alguns mal-estares crônicos, cristalizados, adotam diversas formas sintomáticas. Muitas vezes, o método psicanalítico pode ser o mais adequado para o problema.

O tratamento que se espera e se obtém de um psicanalista é uma análise. Trata-se de um procedimento dialógico que opera exclusivamente pela palavra e, ao mesmo tempo, através dela. Tem por finalidade propiciar mudanças subjetivas profundas. A interpretação e a elaboração das causas do sofrimento psíquico, visando suprimir seus efeitos, é a via específica para superar a alienação neurótica.

A experiência analítica começa desde que alguém aceita se colocar em pauta, questionando sua forma de viver, seu passado e seu destino. Para tanto, aquela deveria levá-lo a um novo e diferente modo de ser, sentir e pensar. Junto com isto, fazer com que assuma a responsabilidade pelas próprias atitudes, as conseqüências dos seus atos, e o que a sorte lhe depare.

O analista tem por função catalisar a transferência, graças à sua escuta. O inconsciente, a voz ativa, diz, por meio da associação livre, o que não se sabia que se sabia. Assim, o analisante também tem a oportunidade de se ouvir, para chegar a descobrir o que realmente quer. Só desta forma poderia se reconciliar com seu desejo, depois de perceber até que ponto tudo aquilo que o martirizava não lhe era alheio.

Na época histórica que nos toca viver, o discurso científico e a razão técnica propõem soluções imediatas para quase todas as coisas. No que concerne às dores anímicas de qualquer índole, parece plausível pretender minimizá-las ou anulá-las, sempre que possível. Afinal, a angústia não tem graça nenhuma. Para tanto, a medicina, com seu arsenal de recursos cada vez mais amplo, prescreve remédios mais ou menos eficientes, num curto prazo, para diminuir o desprazer. Entretanto, nem tudo se cura com pílulas ou comprimidos.

Há mais de cem anos que a psicanálise é praticada, e aprimorada na constância do seu exercício. Disseminada em maior ou menor grau na sociedade, ela constitui um meio terapêutico capaz de resultados positivos e duradouros, provavelmente inatingíveis de outras maneiras.

Desde o seu início, foi uma alternativa eficaz perante a impossibilidade médica de resolver todas as penúrias e impasses que atormentam os seres humanos. Como certas perturbações e inibições não fazem parte das doenças tipificadas, isso determina que a psicopatologia tenha de ser definida a partir da singularidade de quem padece. Assim, para erradicá-las, não adiantam receitas magistrais nem substâncias de última geração, depois de tanta pesquisa, agora disponíveis no mercado da saúde. Fica evidente que a farmacologia tem utilidade suficiente como para merecer o devido respeito, mas, infelizmente, inexistem panacéias.

O inconsciente, patrimônio psicanalítico, nada tem a ver com o sistema nervoso central e vice-versa. A sexualidade da nossa espécie, enquanto enigma íntimo, não coincide com os achados da biologia ou da genética. Tampouco a sexologia, caracterizada por um otimismo pragmático, consegue que o desejo, o gozo e o prazer sejam sempre benfazejos. Se as fórmulas de compromisso que cada um arranja ao longo da própria vida fracassam, e quando nem a felicidade nem a tranqüilidade são mais viáveis, talvez seja o momento exato para procurar uma análise.

Nela, o conhecimento de si mesmo será muito mais do que uma aventura do espírito, pois as questões a serem elucidadas não são filosóficas, universais ou abstratas, senão clínicas, pessoais e bem concretas. Antes e em primeiro lugar, o sujeito, com minúcia e precisão, terá a chance de passar sua existência a limpo, como condição necessária para retificar seus sentimentos e pesares. A decorrência desta atitude sistemática o deixará apto para se situar na realidade que lhe concerne, do melhor jeito possível.

Aliviado do peso dos entraves simbólicos, das limitações imaginárias, e isentado dos seus mal-estares, por sua conta e risco correrão seus dias, na procura do bem-estar que lhe é de direito, sem continuar arcando com o dispensável ônus da neurose.

Algumas patologias do cotidiano que podem ser tratadas pela psicanálise:

MEDOS: Angústia, ansiedade, pânico, tensão, pavor e fobias.

TRANSTORNOS DA ALIMENTAÇÃO: Fome exagerada, azia, gastrite, prisão de ventre, perda de apetite e vômitos.

DISTÚRBIOS DO SONO: Insônia, sono alterado, pesadelos, sono excessivo, sonolência diurna e cansaço crônico.

AFECÇÕES ANÍMICAS: Desânimo, incerteza, dúvida constante, rancor, remorsos, culpa, melancolia, tristeza e depressão.

ALTERAÇÕES DO SI MESMO: Descuido, inferioridade, descontentamente, autodepreciação, covardia, anulação subjetiva, inveja, fantasias insuportáveis e dores constantes.

SUPEREU: Desestímulo, dever, auto-exigência, masoquismo moral, ideais impossíveis, sacrifício e pena de si.

ADIÇÕES: Alimentação nociva, TV, drogas lícitas (álcool, fumo e remédios), drogas ilícitas, consumismo, azar, condutas de risco, trabalhismo, superstições e perda de tempo.

TANATOS: Vontade de morrer, perda do sentido, automutilação, somatizações, tentativas de suícidio, esgotamento vital e bolamurchismo existencial.